Meu Sítio

14 outubro 2005

Coimbra

D.Luciano Cabral Duarte

Se agora nós deixamos a Universidade e passamos a ponte, para visitar a Coimbra do lado de lá, a primeira visão, de impressionante beleza, é a Igreja de Santa Clara, meio engolida pelas águas do Mondego. As águas foram subindo progressivamente até chegar onde estão, a mais de meia altura das paredes. A porta por onde entramos, era uma janela. Lá no fundo, a rosácea do belo templo é quase aflorada pelas águas. Ali, à direita, sob aquela escada sombria, é a porta por onde saía a Rainha Santa Isabel, com o colo carregado de pão para os pobres, quando o seu real esposo a encontrou e lhe perguntou, com ar de censura, o que levava, e os pedaços de pão se transformaram em rosas vermelhas...
Foi também ao fundo da velha igreja de Santa Clara que Dona Inês de Castro esteve enclausurada, num convento de religiosas, e ali ela recebia, levadas por um regato, as cartas de amor de Dom Pedro, que a posteridade chamou "o Justiceiro".
A algumas centenas de metros da igreja de Santa Clara está a Quinta das Lágrimas, onde a tradição, desde Camões, vê o local da tragédia de Dona Inês. Uma coisa é certa: foi entre a igreja de Santa Clara e a Quinta das Lágrimas que tudo se passou.
Foi a 17 de janeiro de 1355 que Inês de Castro foi assassinada. um jovem guia de turista nos conta, na Quinta das Lágrimas, com graça e ingenuidade, a história deste amor trágico, uma das mais belas e lancinantes histórias de amor que enchem o mundo. O Príncipe Dom Pedro fora casado por seu pai com uma princesa portuguesa, viúva, que trouxe da Espanha, onde habitava, uma moça de rara beleza, como dama de companhia: Inês de Castro.
Dom Pedro apaixonou-se por Dona Inês. Inteirada do que se passava, a princesa tentou apagar o fogo da paixão do seu esposo, internando no convento de Santa Clara a jovem e bela Inês. Em seguida, morre a princesa, e quando os caminhos estando aplainados. Dom Pedro quer casar-se com Dona Inês, são os nobres da corte portuguesa que se opõem, com medo que, sendo ela espanhola, a coroa de Portugal volte a ser conquistada pelo rei de Castela.
O amor de D.Pedro resiste a todas as ponderações. Dona Inês mora aqui, nesta Quinta das Lágrimas, e no banco de pedra, ao lado da fonte murmurejante, o príncipe vem repetir ao seu bem-querer as palavras do seu amor e de sua fidelidade.
Os nobres da corte tomam então a resolução trágica: obter do rei a permissão de assassinar Dona Inês. O rei tergiversa, mas autoriza o crime. E, numa manhã, enquanto Dom Pedro estava longe, três nobres batem à porta de Dona Inês. Esta aparece rodeada de seus três filhos que choram. Os assassinos a conduzem ao jardim, onde a sacrificam. E o branco pescoço ferido (diz o guia), gotejando sobre o regato do jardim, deixou cair manchas de sangue que ainda hoje se vêem nas pedras, sob as águas do rio.
A reação do jovem príncipe foi implacável, quando, dois anos depois, morto seu pai, ele subiu ao trono. Aprisionou dois dos assassinos. (O terceiro fugiu para a Espanha). Fez abrir-lhes as costas, e arrancar-lhes o coração, que o rei mordeu e deu aos cães.
Mais ainda: Dom Pedro mandou desenterrar o cadáver de Dona Inês, assentá-lo no trono da Sé Velha de Coimbra, e coroou Inês de Castro rainha de Portugal, obrigando a corte a beijar a mão do esqueleto.
Dom Pedro, o Justiceiro, nunca mais se casou. E tive ocasião de ver, na igreja do mosteiro de Alcobaça, os dois suntuosos mausoléus de mármore que ele fez construir, para si e para dona Inês do Castro, cada um de um lado, em frente da capela-mor, ambos com os pés voltados para a nave central do templo, de modo que, quando soarem as trombetas da ressurreição, os dois se vejam, ao levantar-se, face a face, para o amor enfim reencontrado...

Do livro "Europa e europeus"-D.Luciano Duarte
In "Redação para concursos e vestibulares"-Cecílio Cunha
4ª Edição - Obs.:Transcrição "Ipsis literis"